Tidos
erroneamente por muitos leitores como uma “arte menor” ou “subliteratura”, as histórias em quadrinhos são uma forma preciosa de arte capaz de empregar
arranjos sequenciais e conjugadas de imagens e texto. Ciente do grande
potencial criativo e comunicativo das HQs, o cartunista paulista Spacca adaptou
para os quadrinhos o romance Jubiabá,
de Jorge Amado, lançado em 2009 pela Companhia das Letras.
Terceiro
romance do autor baiano, trata-se de um dos melhores livros de Jorge Amado,
narrativa vibrante e irrequieta que acompanha as aventuras (ou desventuras) do
negro Antônio Balduíno (ou Baldo) que em meio a bebedeiras, lutas e amores, empreende uma
jornada em direção ao entendimento de um mundo de poucas luzes, cujas ameaças e constantes reviravoltas o levam a
adotar um código próprio de honra, onde a brutalidade surge não como um
artifício, mas como uma defesa. É dando
“o seu jeito” e sem esquecer das lições do pai de santo que dá nome ao romance
(que sempre alertava que quando o homem “vaza o olho da piedade ”, só lhe resta
a crueldade) que Baldo vivencia uma experiência de liberdade quase plena, dando
vazão a impulsos e desejos, exigindo de si mesmo uma revolta autêntica diante
dos percalços impostos pela vida.
Com engenho e
dinamismo, Spacca captou as nuances do romance de Jorge Amado, transformando-o
em páginas ricamente ilustradas, com o melhor da articulação entre a palavra e
a imagem que os quadrinhos podem oferecer. Por não
ter exatamente a mesma sensibilidade do escritor, Spacca promove novas
perspectivas, numa alteração do espaço narrativo que evidencia um diálogo entre
as artes. A HQ, a exemplo de uma adaptação cinematográfica, pode expandir,
criticar e reatualizar o texto original, dotando-o de uma atmosfera que seja
equivalente – enfim, uma tradução. Afinal, adaptar é isso, gerar uma obra
independente capaz de atualizar e/ou ampliar os significados do texto adaptado.
Logo, o gibi Jubiabá evoca os cenários e os personagens do
universo amadiano de uma forma muito peculiar, realçados pela expressividade do desenho, além de incorporar um maior valor
literário ao conteúdo da HQ. Ainda que não seguisse essa intenção, Spacca
consegue reproduzir o verbo deliciosamente pitoresco da narrativa de Jorge
Amado, situações naturalmente condensadas, pois, como mencionamos, estamos
falando de duas formas artísticas distintas, sendo que a literatura, em
especial o romance, pode expandir situações, abranger diversos focos e procedimentos
formais, tornando-se por excelência um gênero multiforme. Nos quadrinhos, há
cortes, exatidão, emprego de um ritmo mais veloz. Torna-se tão somente outra
modalidade narrativa, e nesse sentido a HQ de Spacca é exemplar.
Numa cultura marcada
pela presença ostensiva da imagem, a exemplo das telenovelas, os quadrinhos podem
ser uma excelente alternativa para estimular o jovem leitor, haja vista o potencial
das HQs de condensar tanto as possibilidades da linguagem verbal quanto visual.
Ademais, lembrar esse mesmo leitor que a literatura continua sendo uma fonte
rica e inesgotável de ideias, fator que Spacca faz questão de frisar na
adaptação para os quadrinhos de Jubiabá.
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